Minha monografia, na época da faculdade de Direito, teve como tema " A legalidade do aborto eugenésico em casos de anencefalia". Já naquela ocasião, conclui meu trabalho sendo favorável ao aborto anencefálico,haja vista se tratar de um natimorto.
Segue na integra a conclusão do meu trabalho:
Após a análise científica dos ensinamentos trazidos pela doutrina nacional, bem como, do estudo do inicio do julgamento da argüição de preceito fundamental de número 54 pelo Supremo Tribunal Federal, os quais serviram de base para o desenvolvimento a respeito do tema central desse trabalho, levou-nos a alcançar algumas importantes deduções lógicas conclusivas conforme descrição abaixo.
A primeira conclusão é a de que o feto portador de anencefalia é um natimorto, uma vez que se a Lei dos Transplantes em seu art. 3º dispõe: “A retirada post morten dos tecidos, órgãos ou partes do corpo humano destinados a transplante ou tratamento, deverá ser precedida de morte anencefálica...”. Logo, se não há cérebro não há vida.
A segunda conclusão, de índole psico-social, e talvez a mais importante, seja o direito de escolha da gestante, o direito de evitar que seu sofrimento se estenda por toda a gestação, até o nascimento e constatação da morte no nascituro. E, dentro dessa concepção, pautando-se pela doutrina penal, chega-se ao raciocínio de que tal fato pode ser perfeitamente enquadrado como uma hipótese de excludente de culpabilidade, já que a ninguém, a nenhum segmento da sociedade, é dado exigir da mulher-gestante um comportamento diverso, pois juridicamente não se consegue valorar sua conduta diante dos comportamentos sociais aceitáveis.
Para corroborar o entendimento acima exposto, indutivamente, após exaustivas pesquisas, podemos concluir com absoluta certeza, que a esmagadora maioria dos fetos portadores de anencefalia “sobrevivem”, no máximo, 48 horas após o parto. E mais, que as gestações de anencéfalos causam patologias maternas como hipertensão e hidrâmnio (excesso de líquido amniótico), o que levam essas gestantes a uma gravidez de risco elevado.
Ademais, em uma terceira etapa conclusiva, ressaltou-se que, em tese, o caso concreto ainda não se enquadra nas hipóteses do art. 128 do CP, porém, já existe projeto de lei em trâmite no Congresso Nacional incluindo tal hipótese no rol de condutas permitidas de abortamento. E, também constatamos que tal projeto está com seu trâmite parado aguardando o julgamento de mérito a ser proferido pela mais alta corte de justiça do País. No entanto, entendemos que, como a lei nada mais é do que um produto oriundo do que clama a sociedade, ela sempre deve acompanhar os avanços tecnológicos da medicina e dos vários segmentos científicos presentes numa sociedade, que, hoje, antecipam, por meio de vários métodos de exames, essa realidade cruel que assola o feto, a gestante e sua família.
É importante ressaltar, como uma quarta dedução lógica conclusiva, que o judiciário brasileiro estava se posicionando favoravelmente a tal prática, tendo em vista os inúmeros alvarás concedidos autorizando o abortamento nesses casos. Claro, tratava-se de um verdadeiro contorcionismo interpretativo dos Juízes, que entendendo todos os problemas físicos, emocionais e psíquicos a que as gestantes e seus familiares passam ao tomarem conhecimento desse diagnóstico terrível e definitivo como o da anencefalia que inviabiliza a vida extra-uterina, acabavam por conceder a permissão judicial.
Por fim, e pautando-se na peça mais importante para esse trabalho, a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental de número 54 do Supremo Tribunal Federal, estudada desde a petição inicial do caso até a douta e sábia decisão do Ministro Marco Aurélio de Melo, chegamos a última conclusão e, talvez a mais jurídica e distante dos argumentos sociais, que o fato é absolutamente atípico dentro da concepção criminal do mesmo.
Deduz-se o entendimento acima exposto – atipicidade do fato – pois, para que um fato seja enquadrado como crime é necessário o preenchimento de todos os elementos que compõem o seu primeiro substrato, o fato típico. Sendo assim, concluímos que a conduta de interromper a gravidez que tenha como produto um feto anencefálico, comprovado através de laudos médicos, não se enquadra nos tipos penais previstos nos art.124 e 126 do CP, haja vista que, não ha bem jurídico a proteger nesse caso, visto que a malformação inviabiliza a própria vida intra-uterina. Logo, deveria ser interrompida sem que haja punição criminal para a gestante ou profissionais de saúde envolvidos na interrupção terapêutica da gestação. Inequívoca se torna esta conclusão, pois essa conduta sequer configura um fato típico, uma vez que recai sobre corpo sem vida para o direito, já demonstrado pelo art. 3º da Lei nº. 9.434/97 (Lei de Transplantes), configurando o crime impossível por absoluta impropriedade do objeto o que exclui a tipicidade da conduta.
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